segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Você não tem o direito

Você não tem o direito de estar apenas nos meus sonhos.

Você não tem o direito de derramar as minhas lágrimas.

Você não tem o direito de dominar os meus pensamentos.

Você não tem o direito de fazer pulsar mais forte o meu coração.

Você não tem o direito de deixar meus braços vagos sem o seu abraço.

Você não tem o direito de privar meus ouvidos do som da sua voz.

Você não tem o direito de deixar esse vão nos meus lábios sem os seus.

Você não tem o direito de deixar esse vazio em mim.

Você não tem o direito de não existir pra mim.


“Você não tem nenhum direito de me manter esperando aqui.
Você não tem nenhum direito de manter a dor aqui”

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Oi, moço

(Para ser lido ao som de "Confessions" - City and Colour)



Há quanto tempo, não? Confesso que já não lembrava mais do seu sorriso. Estava com saudade de me ver nos seus olhos. Senti falta do seu abraço. Desejei tanto ter seu beijo novamente... Mas, passou. Por favor, sente-se. Há algumas coisas que preciso lhe dizer. Não, quero que se sente de frente para mim. Quero que olhe em meus olhos enquanto me ouve. Ah sim, vai me ouvir, porque da última vez que estivemos juntos, você me tirou todas as palavras com o golpe que me deu. Você tirou o meu chão, sabia? Por acaso não se lembra das vezes que me abraçou forte e disse que não abriria mão de mim? Por acaso não se lembra dos meus olhos nos seus enquanto eu pedia para que não soltasse a minha mão? Mas você soltou. Você soltou e eu me perdi. Sabe quando você fica sem rumo, quando as coisas parecem não fazer mais sentido? Eu não sabia para onde olhar, para onde ir, o que fazer, o que pensar... Você me desnorteou. Consegue imaginar a bagunça que fez na minha cabeça e no meu coração? Tem noção de como desorganizou a minha vida? Mal pode imaginar o quanto chorei. É, moço. Que bagunça. Não, não se preocupe. Agora não precisa mais se preocupar. É tarde para isso. Aos poucos eu estou reorganizando tudo, como já fiz várias vezes. Sabe o que é mais engraçado? Antes de te conhecer, eu me sentia dona de mim. Julgava-me protagonista de minha história e havia decidido que daria o papel de coadjuvante a quem realmente o merecesse. Você me disse que seria merecedor. E é assim que demonstra isso? Você me fez sonhar e depois me acordou para a realidade que sempre foi a minha vida. Doeu despertar deste sonho bom. Não, não seque minhas lágrimas. Elas não estão sendo mais derramadas por você. Eu choro por mim mesma. Choro por ter permitido que tudo isso acontecesse de novo na minha vida. Vou tirar você do meu coração, por mais que isso me doa. Não! Poupe as suas palavras, eu não as quero. Não quero sua voz ecoando em meus ouvidos. Não quero que me responda nada. Já não me importam as suas explicações, os seus motivos, já não me importa mais nada. Pode ir agora. Desta vez, definitivamente. E não olhe para trás como fez da última vez, deixando-me com esperanças de um possível retorno. Ah, aproveite e leve algumas coisas que eu separei da minha caixinha de lembranças. Leve consigo todos os seus abraços, cada um dos beijos que me deu, essa porção de palavras (falsas?) que me disse e algumas promessas que me fez. Pode levar tudo, não quero guardar nada. Isso me machucaria todas as vezes que eu olhasse para a caixinha e me desse conta do quanto fui boba. Boba, sim. Eu não deveria me entregar tão facilmente, tão inteiramente, tão intensamente. Mas, enfim. Não sei ser de outro jeito. Leve tudo o que lhe pertence e me devolva tudo o que lhe dei. Devolva meus abraços, meu carinho, meus beijos, minhas palavras, meus pensamentos. Devolva o meu amor. Sei que não lhe dei muito, mas foi tudo verdadeiro, foi tudo muito intenso. Só não peço para devolver meu tempo porque é impossível, eu sei. Já disse que não precisa secar minhas lágrimas, elas não lhe pertencem. Não mais. Elas secarão. Mas, antes, preciso que elas lavem minha alma, preciso que elas tirem as manchas que você deixou em meu coração. Desejo que você seja feliz. Apenas isso. Te amo tanto a ponto de deixá-lo livre. É, moço, eu te amo. Por enquanto. Mas isso passa, certo? Claro que passa. Vá e deixe que o tempo me cure. Deixe que o tempo seque minhas lágrimas, como ele sempre fez. Vá e deixe que o tempo me faça companhia. Adeus.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Movimentos parados

Podia sentir o vento arrepiar sua pele naquela longa tarde de domingo. O posicionamento do sol já anunciava o entardecer quando ela sentou à beira d’água.  A água fria a fez estremecer quando seus pés tocaram a superfície e, calmamente, submergiram. O vento moldava na água pequenas ondulações e as soprava gentilmente em direção à margem, abraçando e massageando as pernas da menina. Ela estava cansada da corrida que fizera até ali, percorrendo a trilha aberta entremeio às árvores perto da praia. Enquanto corria, seus olhos esquadrinhavam tudo ao redor e emolduravam aquelas cenas no olhar da menina. Ela gostava de ver o calmo agito das folhas. Tinha a enorme sensação de uma pequena paz ao observar como o vento rompia o silêncio balançando as folhas. Elas estavam sempre em movimento sem ir a lugar algum.

A combinação de seu corpo quente com a água gelada provocava uma estranha sensação que fazia a menina arquejar de vez em quando. Com uma das mãos, apoiava-se e reclinava o corpo. Com a outra, desenhava na areia figuras abstratas, como uma representação de seus pensamentos.

Revendo as cenas gravadas em seus olhos durante a corrida que fizera, a menina se viu correndo diante de sua vida enquanto observava seus movimentos parados, como os das folhas. Por mais que ela andasse, sentia-se sempre no mesmo lugar. Sentia-se presa. Sentia-se inerte naquela turbulência que a fazia correr, que a fazia fugir de si mesma. Quantas contradições, não? Paradoxos eram metáforas de sua vida.

Olhou para o céu e viu nuvens que traziam uma promessa de chuva. Sem piscar, voltou seu olhar para a água calmamente agitada e sentiu umedecer seu rosto. Talvez uma gota de chuva. Talvez uma lágrima. Quiçá fosse uma mescla das duas.

E a menina pensou que talvez fosse como uma folha, presa na grande árvore da vida: movia-se sem sair do lugar, vivendo à espera de sua queda. 

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Folha em branco

A brisa suave daquela tarde aos poucos se transformava em vento forte, que balançava a cortina do quarto. Uma ameaça de chuva, talvez. A fresta da janela permitia a entrada de uns poucos raios de sol naquele ambiente sombrio e carregado. A escrivaninha empoeirada suportava o peso dos livros, da pilha de papel e dos pensamentos lançados naquela folha em branco. Em branco porque seus dedos não sabiam como recolher os pensamentos espalhados e transformá-los em palavras. E eles se perdiam entremeio a tudo. Entremeio a quase nada. O móvel suportava, ainda, o peso da cabeça da menina, apoiada nas mãos entrelaçadas que cobriam seus olhos e escondiam um olhar perdido, um olhar vago, um olhar para o nada. Talvez seus olhos estivessem cansados de procurar as palavras certas e seus dedos cansados de tentar aprisionar os pensamentos perdidos no meio do nada. A lixeira transbordava de papéis amassados, agora inúteis porque foram incapazes de guardar o que ela pensava, o que ela sentia, o que ela precisava dizer.

A xícara ao lado dos livros guardava o aroma do café quente, que entorpecia a menina. O barulho insistente do ventilador se confundia com a música triste e abafada, compondo uma sinfonia descompassada que mergulhava nos ouvidos da menina e a imergia num mar de águas calmas e repletas de ondas ao mesmo tempo.  Um conflito pacífico que mantinha a menina refém de suas ideias, com as palavras não ditas apertando sua garganta. Ela podia sentir o gosto das lágrimas. O perfume adocicado e inebriante transportava suas lembranças para uma época em que as palavras eram mais fáceis de serem encontradas e ditas. Para uma época em que seu sorriso não era ofuscado pelo seu olhar triste e perdido. Seus olhos agora brilhavam não mais de alegria, mas porque as  lágrimas os inundavam.

A folha em branco sobre a mesa encarava a menina com um tom desafiador. Talvez por isso a menina evitasse olhar diretamente para ela. Sentia-se inapta a aceitar tamanho desafio de colocar no papel as palavras de que precisava para expressar a sua angústia. A angústia de quem estava prestes a tomar uma decisão capaz de mudar o rumo de sua vida pelos próximos meses. Ou anos, talvez. Não suportava o sentimento de impotência. Ela precisava encontrar as palavras capazes de carregar a sua dor, a sua mágoa, a sua agonia e a necessidade que sentia de uma decisão, de uma resposta daquele que havia entrado em sua vida e bagunçado seus sentimentos. A mesma bagunça que adornava, agora, sua escrivaninha. Com uma das mãos, interrompeu o percurso da lágrima em seu rosto. Com a outra, segurou firme na caneta, numa tentativa desesperada de se livrar daquelas palavras que a sufocavam. Talvez aquela folha em branco permanecesse ali por muito tempo encarando a menina, enquanto ela continuava revirando sua mente e despejando pensamentos para que seus dedos os capturassem em palavras. E ela suspirou.

Talvez a menina tivesse uma folha em branco dentro de si, dentro de seu coração. Só precisava de alguém que soubesse encontrar e escrever as palavras certas. Estava farta de rascunhos. 

Parênteses

Lá estava ela outra vez, parada diante de sua vida. Sentia-se uma espectadora e não a personagem principal. Como podia permitir que outras pessoas escrevessem a sua história? A menina é quem deveria escrever a própria história e ser a protagonista de sua trama. Mas ela já não sabia como fazer isso. Talvez não soubesse escolher personagens coadjuvantes capazes de acompanhar sua história. Pode ser. Mas o que fazer se ela mesma não sabia que destino dar a si? Era como se estivesse andando na estrada e, de repente, se deparasse com uma encruzilhada. Como era difícil fazer escolhas. Pensou que talvez sempre fizera as erradas. E só ela sabia o quanto isso lhe custou. Não era fácil corrigir erros. Alguns lhe causaram danos irreparáveis. Tempo? Não. Doce ilusão pensar que o tempo cura tudo. Não cura. Não tudo. Cura quase nada.

Agora a menina precisava decidir seu destino: ou seguia pelo caminho que a levaria adiante, um caminho incerto, desafiador, porém novo. Ou voltava pelo caminho que percorrera até ali, um caminho cheio de sombras, de dúvidas.

Se escolhesse seguir adiante, precisaria arrumar a sua mala. Era preciso jogar fora algumas mágoas, dando lugar a umas peças a mais de coragem e força; deixar pelo caminho ilusões e decepções, para colocar um pouco mais de esperanças e fé; enterrar alguns amores mal resolvidos e... o que deveria colocar na mala para substituir isso? Agora havia um grande espaço na mala. A menina tinha mais coisas para jogar fora do que para colocar em sua bagagem. Talvez ela devesse deixar assim, com bastante espaço para futuras partidas. Nunca se sabe quando teremos que recomeçar. É sempre bom termos reservas de esperança e de força. Mas a menina não conseguia se livrar de algumas lembranças. Parada sob a sombra da árvore perto da encruzilhada, ela sentou. E começou a mexer na caixinha de lembranças que levava na mala. Não havia muitas lembranças recentes. Encontrou lembranças antigas. Algumas muito parecidas com as novas. Havia muitos sorrisos, carinhos, algumas falsas promessas, inúmeros abraços, milhares de palavras, inesquecíveis momentos... Ai. Doeu mexer naquela caixinha. Lembranças doem, né? Não, melhor não mexer nas lembranças ainda. Não sabia quais deveria guardar e quais deixar pelo caminho. Fechou a caixinha e a pôs na mala, ao lado das esperanças, e voltou para a encruzilhada, carregando sua mala e a cruel necessidade de fazer uma escolha.

Os raios do sol pesavam sobre a menina, o que tornava aquele momento de decisão ainda mais difícil. Ah, como ela estava confusa. Precisava seguir um dos caminhos, não poderia mais ficar ali parada. Estava vendo sua vida passar. Não conseguia mais guiá-la. Talvez mais alguns minutos e ela resolveria o que fazer. Ou quem sabe uns dias. Ou semanas? Não. O quanto antes. Estava cansada de se observar. Precisava voltar a ser a protagonista de sua vida. Precisava continuar escrevendo sua história e sair desses parênteses que havia aberto. Precisava colocar uma vírgula e dar um final feliz à sua trama. Não precisava de um coadjuvante e sim de alguém que dividisse com ela o papel principal. Precisava de alguém que a ajudasse a carregar a mala e não que a deixasse mais pesada. Mágoas pesam muito.

E a menina pensou que alguns parênteses são difíceis de serem fechados. 

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Uma nova música



Seus pés agora tocavam a parede no ponto mais alto que as pernas permitiam alcançar. Um braço estendia-se junto ao corpo, que repousava sobre a superfície fria e apática do piso. O outro braço fazia uma suave curva e pendia sobre a cabeça, denunciando o cansaço e a calma dela. Os cabelos negros e compridos desenhavam-se pelo chão do quarto, contrastando com a brancura do piso e da menina. Seu corpo quente se arrepiava ao toque frio. Oposição perfeita. Quente e frio. Assim era a menina: quente por fora, fria por dentro. Com uma das mãos, ela acompanhava o ritmo da música que embalava aquele momento de calmaria. Dedilhando seu corpo, podia sentir a melodia enquanto a música mergulhava no vazio que agora tomava conta de seus pensamentos. “Este poderia ser o fim”, diz a letra da música. “Sim. Talvez seja mesmo o fim...”— concluiu a menina — “mas para cada fim, há um recomeço”.

E ela estava certa. Afinal, a vida é feita de finais e recomeços, não é mesmo? O final de um dia, o começo de outro mais bonito, quem sabe. O final de um livro, o começo de outro mais interessante, talvez. O final de uma amizade, o começo de outra mais leal, provavelmente. O final de um amor, o começo de outro. Apenas outro. Sem expectativas de ser mais intenso, mais bonito, mais duradouro, mais fiel ou simplesmente verdadeiro. Apenas mais um amor. Correspondido, de preferência. “Este poderia ser o fim”, repetia a canção. De fato, poderia ser o fim daquele sentimento que ela julgava ser amor. Agora não estava tão certa disso. Talvez fosse melhor assim. O amor não deveria doer como estava doendo. Então ela pensou que talvez não fosse amor. Talvez não fosse.

Os olhos tranquilamente fechados abriam uma janela, através da qual podia ver a si mesma. A menina se debruçou nessa janela e ficou observando todos os finais e recomeços de sua vida passando diante de seus olhos. E ela percebeu que, embora estivesse vivendo outro fim, ela poderia recomeçar. Ela sabia recomeçar. Era forte o suficiente para fazer desse fim um novo começo. E sorriu. Suspirou extasiada e despertou daquela contemplação interior. “Este poderia ser o fim”, insistiam a menina e a canção.

Abriu os olhos e sentiu o ritmo da música diminuir. Estava chegando ao fim. Mas a menina sabia que começaria uma nova música. Viu? Finais e começos. Era sempre assim. Esse seria apenas mais um. E ela decidiu que sua divagação duraria exatamente o tempo da música. A menina se preparou para mergulhar em outro devaneio com o começo de uma nova canção. Ajeitou o cabelo, enrolando-o com o dedo, respirou fundo e fechou os olhos outra vez. 

Estava pronta para imergir em si novamente, estava pronta para uma nova música. Estava pronta para um novo começo. 


E a menina pensou que todo fim é a chance de um recomeço.


(Música: "The end" - Kings of Leon)

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Nota da menina sobre a menina

E eis que a história da menina ganhou, digamos assim, uma certa repercussão. Este humilde e lindo (risos) blog teve muitos acessos nos últimos dias, o que me deixa imensamente feliz. Sem falar nos comentários lindos que os raros porém especiais leitores deixam nos textos em que falo sobre a tal menina. Para quem conhece este blog ou me segue no Twitter há certo tempo, sabe o que se passa comigo no momento. Pois é. Para aqueles que não sabem, a tal menina dos textos sou eu. E sei que é, de certa forma, um pouco de todo mundo. Sei que não sou tão menina assim, né, mas tudo bem. Permitam-me autodenominar assim, com licença, obrigada.

O que me deixa mais feliz, além do fato de vocês lerem o que escrevo, são os comentários que muitos deixam. Alguns dizendo que passaram por situações semelhantes, outros dizendo que gostaram de ler, outros dando conselhos, outros me convidando para ir a um barzinho (esse ainda não rolou, mas to dando uma ideia aqui pra vocês, anotem). Enfim. No Twitter, uma menina chegou até a criar uma conta apenas para me dizer que o moço não me merece. Gente? Fiquei tão emocionada porque eu realmente não esperava isso tudo, essa atenção. Obrigada.

Muitas vezes, sem ter com quem conversar pessoalmente, o blog e o microblog são as únicas válvulas de escape de que disponho para não enlouquecer com as palavras que me sufocam. Eu preciso expulsá-las de mim. E uso para isso as histórias da menina. Contar as minhas histórias em terceira pessoa é uma maneira de me olhar, de me ver em outra pessoa e isso, por incrível que pareça, alivia o que sinto. Penso, assim, que pode haver mais pessoas vivendo histórias semelhantes a minha. E, através das respostas de vocês, percebo que há sim. E isso me acalma. O que sinto ao ler os comentários nos textos aqui é algo indescritível, que me deixa muito, mas muito feliz. Sério mesmo. Obrigada, de coração.

Para quem tiver paciência, quiser conhecer melhor a história da menina e tentar entendê-la, sugiro que leia na ordem:

Outros textos com a menina:

Mais uma vez, obrigada. 
Beijo da menina Dani.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Um sorriso paradoxal

O sol brilhava muito naquela tarde sufocante de verão. A leve brisa que tocava sua pele mal balançava seus negros cabelos, esquecidos sobre seu ombro esquerdo. Não havia sinal de chuva e isso tornava o clima pesado, assim como o coração da menina.  Se ao menos tivesse uma promessa de chuva, mas sequer isso ela tinha. Sentada sob  a árvore, observava como a brisa impulsionava as folhas, fazendo-as mover num ritmo lento e despreocupado. Ela podia ouvir o toque do vento nas folhas, que se agitavam e rompiam o silêncio que se instaurara desde que ela havia parado de pensar. Suas pálpebras, agora pesadas e hesitantes, escondiam aos poucos seus doces olhos castanhos. Sua cabeça já não a obedecia e pendeu sobre o ombro direito. E a menina adormeceu.

“Como eu posso parar esses pensamentos?”, pensava a menina alguns dias antes. Seus pensamentos haviam se transformado num instrumento de tortura. E ela não queria mais sofrer. Decidira, então, que não pensaria mais. “Não será fácil, eu sei”. Sim, ela sabia. Tinha consciência de que estava prestes a entrar em um conflito do qual sairia machucada. Mas as cicatrizes que ela trazia na alma doíam bem mais, embora o tempo já houvesse sarado as feridas. Conflito algum poderia lhe atingir mais do que já fora. Respirou fundo, como numa tentativa de convencer a si mesma de que era forte, e não pensou mais.

Mas seria possível não pensar? Mesmo quando pensamos em não pensar, estamos pensando. Confuso, não? Era assim que a menina estava. Tão confusa quanto seus pensamentos, quanto sua história.  Mas aquela menina, que agora estava absorta em um sono leve e inebriante e que parecia ser tão frágil ao ponto de ser chamada assim, “menina”, era mais forte do que ela mesma poderia supor. Sim. Ela havia conseguido se livrar daqueles pensamentos que tanto a perturbavam, que tanto a maltratavam, que tanto a sufocavam à medida que invadiam sua mente. De onde ela havia tirado aquele escudo não sabia. Mas ele havia protegido a menina daquelas ameaças de loucura, daquelas lembranças que inundavam seus olhos de lágrimas, daquele devaneio do qual ela sentia medo. Ela sentia medo de seus pensamentos. Como pode alguém sentir medo dos próprios pensamentos? A menina sentia. E não queria mais sentir. A menina, que talvez não fosse tão menina assim, fora obrigada a crescer, mas conservava em si os mesmos sonhos, os mesmos medos, as mesmas fantasias, os mesmos desejos de quando era menina. Sim. Ela concluiu que poderia ser chamada assim. Menina.

Do alto da árvore, uma folha, incomodada com a oscilação dos galhos, desprendeu-se. Na queda, teve seu rumo alterado pelo vento e tocou o braço da menina, desfalecido sobre suas pernas. Suas pálpebras, ainda extasiadas pelo sono, abriram-se devagar e revelaram um olhar perdido nos limites do tempo e do espaço. E então a menina despertou. Emergiu de um breve mergulho em um mar de calmaria. E suspirou. Estava feliz por não pensar mais. Sentia-se bem por não ser mais golpeada pelas lembranças. Levou a mão até a cabeça e livrou seu rosto dos fios de cabelo que lhe faziam cócegas. Sentiu as batidas de seu coração mais amenas. Sentiu seu coração mais afável. E sorriu. O sorriso mais leve e sincero que já se desenhara em sua boca. Um sorriso doce. Um sorriso leve. Um sorriso meigo. Um sorriso frágil. Embora fosse ainda um sorriso triste.

Um sorriso paradoxal.