terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Lágrima de verão

Há dias que não chovia. Pelas suas contas, a última vez que chovera foi também a última vez que ela havia chorado. As gotas d’água eram como suas lágrimas. Enquanto a chuva lavava o ar e as coisas da terra, as lágrimas lavavam sua alma. Agora, o calor a sufocava. A ausência da chuva e das lágrimas a privavam da limpeza de que tanto precisava. Ela precisava de água. Ela queria uma chuva em sua alma.

Naquela tarde de dezembro, deitada na rede sob as árvores, sentia os raros sopros de vento tocarem seu rosto. Enquanto o vento beijava seu rosto e espalhava seus longos cabelos pretos, embalava a rede e conduzia seu corpo em um suave movimento capaz de adormecer qualquer corpo cansado. De vez em quando, ela permitia que o vento invadisse seus pensamentos e trouxesse de algum lugar perdido em suas memórias aquelas sensações que agora lhe eram estranhas. Muito do que vivera até ali foi aprisionado no tempo de suas lembranças. Mas não porque ela quisesse que fosse assim. Simplesmente foi.

O embalo da rede e o toque do vento deixavam seu corpo à mercê do acaso. Suas pálpebras estavam pesadas. Suas mãos, que antes seguravam o livro, estavam desfalecidas e agora se moldavam ao seu corpo. Seus cabelos, bagunçados pelo vento, se espalhavam em sua face e lhe causavam pequenos arrepios. Conduzida pelo ritmo suave da rede, adormeceu. O vento invasor de pensamentos, de repente, cessou. E uma onda de lembranças lhe invadiu a mente em forma de sonhos.

Foram os vinte minutos mais pacíficos e, ao mesmo tempo, mais conflituosos que vivera nos últimos meses.

Os olhos fechados deixaram escapar uma lágrima, que molhou seus lábios. O gosto salgado na boca a trouxe de volta do sono profundo e dos sonhos feitos de memórias. De sobressalto, seu corpo que antes moldava a rede, agora estava trêmulo. Ela não queria ter dormido. Toda vez era essa agonia. Ela não queria aquelas lembranças. Ela não queria sonhar. Mas teve o que precisava, mesmo que escassa: uma lágrima. Pôde, mesmo que por um instante, lavar sua alma. Soube que, mesmo que involuntariamente, conseguiu o que há muito precisava.

Uma lágrima. Uma pequena chuva de verão. Uma lágrima de verão.

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