segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Santa Maria


Hoje eu acordei com a sensação de que nem sequer dormi. Desde cedo, as notícias da tragédia continuam se atualizando e o pesar aumentando. É uma segunda-feira de sol, um dia bonito que não combina com esse sentimento estranho. Que domingo mais pesaroso, mais lamentável, mais doloroso.

Ontem eu fui tantas pessoas, tive tantos sentimentos... Coloquei-me no lugar daquele jovem que, de repente, viu a alegria se transformando em terror e sentiu os seus sonhos sendo sufocados pela fumaça. Pensei na aflição de um pai que espera acordado na cama o filho chegar da balada, torcendo para que chegue são e salvo, mas que, de repente, recebe a notícia de que seu filho nunca mais vai voltar. Senti meu coração apertar ao pensar na mãe que incansavelmente ligava para o seu filho naquela manhã angustiada de domingo, sem saber que o celular tocava a sua música preferida sobre um corpo agora  silencioso. Tentei imaginar o desespero das tantas pessoas cuja missão de vida é salvar vidas, mas que não conseguiram salvar todas as que estavam lá. Vi minha mão tremendo ao imaginar as mãos de quem percorreu com o dedo indicador a lista de mortos desejando não encontrar um nome conhecido. Senti-me desolada pensando nas famílias e nos amigos de quem saiu para dançar naquela noite de sábado e que agora tentam entender o que aconteceu, porque a pessoa não mais voltou. Tampouco voltará. 

Que nó na garganta, que dó no coração. Sonhos sufocados pela fumaça, vidas perdidas na névoa, esperanças destruídas pelas chamas. Como dói pensar, como dói esse pesar.

Que os corações sejam confortados. Que a tristeza seja aos poucos amenizada. A tristeza deles, a nossa, a de todos que choram nesse dia tão choroso. Minhas condolências, Santa Maria. 

domingo, 27 de janeiro de 2013

Sobre a amizade


Desejo que você acorde sempre sorrindo, mesmo com lágrimas descendo sobre o seu rosto.
Desejo que você durma sempre agradecendo, mesmo que não tenha notado o que agradecer.
Desejo que você sinta a brisa leve de uma manhã de domingo, sem se preocupar com a segunda-feira que está para chegar.
Desejo que você se orgulhe de sua grandeza, mesmo quando o mundo parece dizer o contrário.
Desejo que você valorize as oportunidades, mesmo quando elas parecem ser tão pequenas.
Desejo que você cante: de alegria, de amor, de felicidade, mesmo quando lhe faltar voz.
Desejo que você trabalhe sempre com respeito, mesmo quando os outros não valorizam o que você faz.
Desejo que você expresse sua raiva, mesmo quando não há ninguém para lhe ouvir.
Desejo que você ame intensamente, ame perdidamente, ame até a última gota, mesmo quando o mundo lhe disser que o amor não existe.
E por fim, se lhe faltar algo, chame os amigos.
Porque tudo eu posso desejar, mas apenas uma coisa posso garantir: amigos nunca lhe faltarão!
Sim, eu sempre estarei aqui.

Texto de Júlia Kauane, uma menina tão querida e doce quanto suas palavras. 

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

E dentre tantos olhares que me cercam,
                                           eu só queria ficar presa no teu...

...mas, em vez de me prender, os teus olhos vivem me perdendo.
                       
      Os mesmos olhos em que me vi e me prendi.
                                                                          E me perdi.

domingo, 20 de janeiro de 2013

Um texto que doesse


Eu queria escrever um texto que fizesse o leitor sentir o que eu sinto.

Eu queria escrever um texto tão triste e tão pesaroso que fizesse o leitor suspirar e derramar uma lágrima sobre o ponto final. Um texto tão melancólico que fizesse o leitor sentir uma tristeza tão profunda ao ponto de dizer “mas que texto mais triste” e chorar de dar dó.

Eu queria escrever um texto tão lastimoso que buscasse na emoção do leitor as suas mais tristes lembranças e as jogasse para fora dos olhos entremeio a lágrimas que inundassem o papel e borrassem a parte já lida do texto. Um texto tão pungente que atingisse em cheio a alma do leitor e o fizesse sentir um vazio tão grande no peito que ele diria “mas que texto mais triste” e desejaria interromper a leitura para me abraçar.

Eu queria que o leitor chamasse quem estivesse ao seu lado para ler o texto também e dissesse “olha que texto mais triste” e a pessoa lesse e sentisse e chorasse e concordasse dizendo entre soluços “mas é mesmo um texto muito triste”.

Eu queria que o leitor ficasse pensativo e com os olhos marejados ao ler o meu texto e pensasse “mas que texto mais triste e lindo de tão triste”. Um texto que doesse. Eu queria que minhas palavras ficassem gravadas na memória e na alma do leitor e que o fizessem chorar ao lembrá-las.

Eu só queria escrever para fazer o leitor sentir o que eu sinto, porque eu escrevo para não sufocar.  O problema é que às vezes eu sinto o que é intransponível em palavras. 

sábado, 19 de janeiro de 2013

Eu nunca


Eu nunca pulei carnaval.  Eu nunca fui a uma festa à fantasia. Eu nunca dancei como vocês dançam. Mas eu sempre sorri, embora não estivesse sempre feliz. Eu sempre me vesti de ilusões, sempre me cobri de fantasias. Ou será que eu sempre me escondi?

Eu sempre quis mudar. Eu sempre quis ser diferente. Eu sempre quis não-ser. Mas, mesmo assim, eu sempre tentei. Mesmo assim, eu sempre fui eu mesma. Eu nunca mudei. Sou uma mistura daquilo que eu sempre quis ser com o que nunca deveria ter sido. E o tempo me afasta cada vez mais de quem eu queria ser. Será que um dia eu voltarei a mim?

Nunca
e sempre me prendem a esse paradoxo que sou. E eu odeio amar paradoxos.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Flor amarela


A luz do fim de tarde invadia a sala com cuidado e coloria os vidros da janela com vários tons de laranja e vermelho. Era um lindo dia de verão, daqueles dignos de fotografias. Na janela, um olhar melancólico absorvia parte dos raios do sol poente enquanto observava as flores do jardim à sua frente.

Elas eram tão bonitas, tão unidas, tão fortes. Aos olhos da menina, as flores eram tão esplendorosas ali, no meio daquela grama seca cor-de-nada, impondo-se com todas as suas cores, com todo o seu perfume, com toda a sua beleza. Ah, como eram lindas.

Lembrou-se, então, de um menino que a chamava assim, “flor”. “Minha flor amarela”. Ah, como ela achava isso bonito... mas nunca entendeu, na verdade, por que ele a chamava assim. Seria pela beleza? O perfume? Ou por que ele se sentia como ela se sentia ao observar as flores no jardim? Será que ele a amava? Bom, fosse o que fosse, já era tarde demais. O menino já não a chamava assim. Ela já não era mais uma flor, já não lhe tinham amor.

Cansada de observar o jardim e as suas lembranças, fechou a cortina e descoloriu os vidros da janela dos raios do sol. Deitou-se no sofá, ajeitou o vestido e acomodou seus longos cabelos negros. Queria dormir um pouco, fugir dos pensamentos. Foi então que viu na mesinha ao lado da televisão um vaso bonito com uma flor igual as do jardim. Era uma linda flor. Talvez fosse até mais bonita do que as outras.  

Pôs-se, então, a olhar para aquela flor no vaso buscando a mesma força, a mesma imponência, a mesma cor, o mesmo perfume, a mesma sensação que encontrara ao observar aquelas flores do jardim, mas... nada. Era apenas uma flor na água. Por mais bonita que fosse, tudo o que estava ao seu redor tinha mais cor do que ela. Ela estava ali sozinha. Isolada. Presa a um mundo que não era o dela. Aos poucos, sua cor ia desbotando e seu amarelo já não brilhava como o das flores do jardim. Ela parecia tão triste. Pobre flor. Às vezes parecia até que chorava. E a menina sentiu pena da flor que já não era mais tão amarela. Pena.

Agora, finalmente, havia entendido por que o menino a chamava assim, “minha flor amarela”: a menina era aquela flor do vaso na mesinha ao lado da televisão. Porque ela era bonita e triste. Talvez a flor mais bonita seja sempre a mais triste, a mais sozinha. Talvez o amor não fosse amor, fosse pena. Pena. 

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Olhar de saudade


Acordara antes que o despertador tocasse naquela manhã preguiçosa de domingo. Não havia dormido muito bem, sentia-se inquieta. Sentou-se na cama e ouviu o barulho da chuva. Vestiu o roupão branco de cetim e caminhou até a janela aberta. Queria sentir a chuva. O vento frio fazia sua pele arrepiar e bagunçava — ainda mais — os seus cabelos. Passou as mãos na cabeça e se virou para o espelho, não queria se sentir feia — por fora.

Encarou o espelho e encontrou-se perdida na própria imagem. Ao alto, viu seus cabelos soltos, porém sem vida. Na testa, as marcas do tempo e do estresse haviam se tornado mais visíveis nos últimos tempos. Procurou em seus lábios lembranças de sorrisos outrora sempre presentes. Buscou neles resquícios de palavras doces agora tão escassas, mas sentiu apenas um gosto amargo. “Seria esse o gosto do arrependimento?”, pensou enquanto contornava a boca com os dedos frios. Ergueu os olhos e se procurou no fundo do seu olhar. Abaixou a mão e suspirou. Encarou-se receosamente e acompanhou o caminho que uma lágrima traçava em seu rosto, até que ela se evanesceu. Seu olhar era de cicatrizes. E elas ainda doíam. Afastou-se do espelho e sentou na cadeira perto da janela. As lágrimas caíam pelo seu rosto como a chuva caía lá fora. Poderia ficar horas ali sentada, observando a chuva e se distraindo com o barulho que ela fazia ao tocar as folhas da pitangueira. A água compunha uma sinfonia calma que a afastava de seus mais sombrios pensamentos. Ah, aquelas cicatrizes... Foi horrível sentir de novo aquelas dores. Mas, cicatrizes não deveriam doer. Por que doíam, então? Por que o gosto deixado pelas palavras dantes doces era tão amargo? Por que tudo tão estranho, tudo tão errado? 

Seu olhar era de saudade.

Fechou os olhos e mergulhou em si. Desistiu de entender, desistiu de controlar aqueles pensamentos. Deixou que as dores viessem à tona e abrissem de vez aquelas cicatrizes em seu olhar. Sentiu suas lembranças se amargarem pelo tempo e chorou. Chorou de soluçar. Chorou mais do que chorava o céu naquela manhã de domingo. Chorou até enfraquecer. Chorava, mas não sabia ao certo o porquê.

Com esforço, levantou-se e se apoiou na janela do quarto vazio. Envolveu-se com os braços na tentativa de encontrar algum alento, alguma segurança. Mas ela só tinha a si. Tinha também os seus pensamentos, aliás. Mas tinha medo de ficar a sós com eles. Não queria mais ficar. Não queria mais sentir. Não queria mais ser.

Olhou fixamente para o céu e — embebida em pranto e agarrada à solidão ­— jogou-se na cama e caiu naquele abismo que havia dentro de si. A chuva vigiaria seu sono enquanto ambos durassem. Quisera ela que chovesse para sempre.