O calor daquela noite de janeiro e as batidas de seu coração compassadas pela angústia estavam sufocando a menina. Sentia o pulsar acelerado trancando sua garganta. Podia ver sua blusa desenhada ao corpo marcada pelo suor. Suas mãos não encontravam uma posição confortável para descansar. Deitada de lado, a menina se virava de bruços, com as mãos espalmando o colchão. De bruços, com o rosto de lado no travesseiro encharcado de tristeza e agonia, a menina se virava de novo e deitava com os olhos vidrados no teto e com as mãos estendidas ao longo do corpo. Já deveria estar dormindo, ela sabia. Não queria acordar com os olhos inchados. Não queria que ele a visse abatida no dia seguinte. Não queria que ele soubesse de sua tristeza. Sim, ela o encontraria no dia seguinte. Infelizmente. Ela não queria reencontrá-lo mais em sua vida. Ele não merecia sequer um pensamento seu.
A música triste e baixa no quarto acentuava a solidão e era o alimento perfeito para sua divagação em busca de nada. Num gesto inanimado e arrebatado de fúria, desligou o rádio. Quem sabe assim, cessando a música, seus pensamentos cessariam também. Perdidos no silêncio que se instaurara, seus olhos se fecharam. E a menina adormeceu.
A menina estava se sentindo mais serena. Apesar da demora e do mal-estar antes de dormir, ela havia dormido bem. Sabia que estava prestes a encontrá-lo. E temia por isso. Tinha medo do que poderia sentir ao revê-lo. O moço. O tão amado e odiado moço. Ela o odiava por amá-lo tanto. Mas não queria sentir mais nada por ele. Nada.
O sorriso dele penetrou como uma lança nos olhos da menina, atingindo-lhe em cheio no coração. Ele parecia bem. Parecia feliz. Ela esboçou um sorriso e o cumprimentou. A menina, paralisada e com o coração fugindo-lhe pela boca, desviou o olhar do olhar dele. Doía olhar para aqueles olhos mentirosos.
Ele se aproximou, abraçou a menina e lhe deu um beijo no rosto. Encostou a boca em seu ouvido e disse que agora estava tudo bem. Ficariam juntos novamente. Mal podia acreditar no que estava ouvindo. Ela suspirou e sorriu.
E, então, a menina acordou. Olhou para os lados e viu que tudo fora apenas um sonho. Um pesadelo, quiçá. O sorriso se desfez, dando lugar à inexpressividade em seu rosto. Levantou-se da cama, tomou um banho para tirar as marcas da longa e difícil noite e foi ao encontro dele. Dessa vez, de verdade. Por incrível que pareça, tudo aconteceu como no sonho. Exceto pela última parte. Em vez de se aproximar da menina, ele ficou parado, enquanto ela tentava amenizar a dor que sentia em seu coração e o tratava com a mesma indiferença e com um falso sorriso desenhado em seus lábios tristes. Usou o sorriso como uma máscara da dor que sentia. E, novamente, ele deu as costas à menina. Mas, dessa vez, ela não cairia. Não, mesmo. E ela deu as costas a ele, também. Estavam, de novo, tão perto e tão longe ao mesmo tempo. E seria melhor assim.
Doses diárias de indiferença curariam a menina daquela dor que sentia em seu coração.